domingo, 2 de novembro de 2008

"A Vida num Sopro" ou a "Literaturazinha"

José Rodrigues dos Santos lançou mais um romance, e como sempre, num tom ligeiramente convencido e com laivos de grande escritor e "homem das letras" lá foi dizendo numa entrevista que li outro dia, que "Os meus romances são muito meus. Não conheço nenhum autor que escreva os romances como eu os escrevo."
Já há algum tempo lhe ouvira dizer no mesmo tom habitual, e deixar bem claro, que era ele (e não Sousa Tavares) o escritor que mais vende actualmente em Portugal, revelando os números que não deixavam margem para dúvida (ou como diria George Bush "Make no mistake..."), como se de uma bandeira e aspecto crucial se tratasse, que tudo diz sobre o que é "um verdadeiro escritor". Pois, devo dizer que os livros de JRS reflectem um pouco os tempos que correm.. Histórias e enredos sensaborões, escritos de forma "normal" e simples.
JRS não é um grande escritor, fique bem claro. Está longe de o ser; É apenas mais uma pessoa que escreve livros. Os livros que escreve conseguem agarrar o leitor sobretudo pelas peripécias que consegue criar, e mérito lhe seja dado, denotam uma aprofundada pesquisa e trabalho sobre vários temas nem sempre acessíveis, mas não passam disso, de livros normais. Aliás, quando tenta revelar-se um bom escritor, quando arrisca alguma descrição ou devaneio mais criativo, borra a pintura, cai na banalidade, no lugar-comum, no foleiro que quer ser belo, no simplório que anseia ser genial, e chega a ser ridículo e naive nalgumas passagens..
JRS não passa disso, de mais um que escreve livros, calhamaços de ler e deitar fora, descartáveis como qualquer notícia que hoje apresenta, e que usamos sem agitar num mundo directo e imediato que existe actualmente. Muito ao jeito da vaga "Dan Brown" que por todo o lado se instalou, em livros que têm de ter mais de 500 páginas (como um pré-requisito que atesta da qualidade, na regra estereotipada e enganosa "livro grande=grande livro"), pitadas de suspense, misticismo e ciência sensacionalistas, e que infelizmente são os únicos que fazem as grandes montras das livrarias actuais, beneficiando de poderosas campanhas de marketing, e tornando o livro que se vende actualmente, sobretudo e apenas mais um entretenimento fácil e demasiado óbvio como tantos outros que criámos (o que vai contra o sentido que tinha e lhe era dado até agora...).
É precisamente um dos grandes equívocos deste senhor, achar que por vender milhares, tem um valor superior ao que realmente tem, e poder comparar-se com verdadeiros artistas da palavra, da língua, da magia e do encanto da escrita genialmente criada e alinhavada...
António Lobo Antunes já deu a sua opinião sobre o novo livro, não indo além de que "é uma grande merda, num país onde todos são escritores" e que fica "assombrado com pessoas que escrevem livros em dois meses".
Pois é precisamente Lobo Antunes, nem de propósito, que recordo em algumas linhas que guardei no meu caderninho há alguns anos, e que se aplicam melhor que nunca e sintetizam o que sinto:
"Em regra só os artistas medíocres dizem coisas interessantes e tenho uma desconfiança instintiva dos verbosos, dos fluentes, dos engraçados, dos que dissertam, sem pudor, acerca do seu trabalho."

3 comentários:

Zara disse...

E por entre os seus devaneios menos criativos ainda não consegui acabar a Fórmula de Deus...

Prometo que devolvo quando acabar (nem que seja para deitar fora)

beijinhos grandes
fani

Gil disse...

Cal, de José Luís Peixoto.
Leitura obrigatória para ti meu caro, que, como eu, gostas tanto de velhotes e coisas boas para ler.

Unknown disse...

Fani: É verdade, os devaneios são bastante "impessantes", mas nem tanto!! :) Mas podes devolver, que nao vai pro lixo (foi oferecido!) ;) Beijinhos

Gil: Já ando para o comprar há algum tempo, mas fica sempre para trás.. Será uma opção para o futuro, afinal nem só do que os velhotes escreveram vivemos.. Abraço