A mais recente entrada na biblioteca (cada vez mais poeticamente gastronómica...), este "Mariscos, os frutos do mar" de Mário Varela Soares. Entre receitas e afins, retiro alguns apontamentos de uma interessante reflexão inicial acerca da alimentação e da vida actual, enfim do "mundo em que nós vivemos"...
Escreve ele:
"Estamos no reino da prestação, do nivelamento consumista, dos carros, dos artefactos televisivos, das máquinas, da aparência social do traje, do enfeite ou da marca: num espaço de incultura generalizada onde não se lê, não se conversa, não se pensa. Como se a trajectória da vida fosse um emprego, que não uma profissão, e o seu objectivo ir sacar à segurança social a sobrevivência da pensão."
"A comida quase que deixou de ser amigável, catalisadora do espaço de convívio ou da reunião familiar, para se resumir a uma mera ingestão de proteínas, vitaminas e nutrientes. Numa forma estandartizada em que o gosto já não é a alquimia dos tachos, mas a experiência dos laboratórios."
"Comer de pé voltado para uma parede contando os tostões e o tempo pode ser um acto de sobrevivência, mas não é um gesto humanizado."
"Os prazeres podem ser fortuitos, mas têm de ser digeridos, os alimentos podem ser simplistas, mas têm de ser saboreados. Por isso a refeição deve ser uma pausa contemplativa da nossa criatividade e do nosso poder de escolha. Uma pausa onde possamos exprimir, com gestos comedidos, toda a grandiosidade da existência."
"MARISCOS, os frutos do mar"
Mário Varela Soares
Colares Editora, 2000
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