quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

"As chamadas "Delícias do mar", sob a forma de batons de cola ou rabos de lagosta, são um atentado à inteligência e um ultraje à cozinha."

...ainda do "Mariscos, os frutos do mar" de Mário Varela Soares. Ah pois é, não diria melhor!

Mariscos, os frutos do mar


A mais recente entrada na biblioteca (cada vez mais poeticamente gastronómica...), este "Mariscos, os frutos do mar" de Mário Varela Soares. Entre receitas e afins, retiro alguns apontamentos de uma interessante reflexão inicial acerca da alimentação e da vida actual, enfim do "mundo em que nós vivemos"...
Escreve ele:

"Estamos no reino da prestação, do nivelamento consumista, dos carros, dos artefactos televisivos, das máquinas, da aparência social do traje, do enfeite ou da marca: num espaço de incultura generalizada onde não se lê, não se conversa, não se pensa. Como se a trajectória da vida fosse um emprego, que não uma profissão, e o seu objectivo ir sacar à segurança social a sobrevivência da pensão."
"A comida quase que deixou de ser amigável, catalisadora do espaço de convívio ou da reunião familiar, para se resumir a uma mera ingestão de proteínas, vitaminas e nutrientes. Numa forma estandartizada em que o gosto já não é a alquimia dos tachos, mas a experiência dos laboratórios."

"Comer de pé voltado para uma parede contando os tostões e o tempo pode ser um acto de sobrevivência, mas não é um gesto humanizado."

"Os prazeres podem ser fortuitos, mas têm de ser digeridos, os alimentos podem ser simplistas, mas têm de ser saboreados. Por isso a refeição deve ser uma pausa contemplativa da nossa criatividade e do nosso poder de escolha. Uma pausa onde possamos exprimir, com gestos comedidos, toda a grandiosidade da existência."


"MARISCOS, os frutos do mar"
Mário Varela Soares
Colares Editora, 2000